quarta-feira, 15 de julho de 2009

Esclerose múltipla - artigo da revista mente & cérebro


A doença do imprevisto
A esclerose múltipla, uma patologia degenerativa que afeta principalmente pessoas com idade entre 20 e 40 anos, muitas vezes é confundida com stress; diagnóstico precoce é fundamental para manter a qualidade de vida do paciente

por Luciana Christante




Quando se fala em doenças neurodegenerativas, a maioria das pessoas logo pensa em idosos com limitações físicas e principalmente cognitivas, que os impedem de levar uma vida autônoma, como no Alzheimer ou no Parkinson, por exemplo. Embora a esclerose múltipla pertença à categoria de distúrbios que provoca degeneração neurológica, difere em pelo menos dois aspectos. Em primeiro lugar porque nessa patologia a incapacidade física é bem mais pronunciada que a cognitiva, o que à primeira vista poderia até ser um atenuante, não fosse pela segunda característica: a doença se manifesta quase sempre entre os 20 e os 40 anos, isto é, no auge da vida produtiva do indivíduo. O choque do diagnóstico, que costuma vir depois de uma via-sacra por vários médicos e pode levar anos, traz inicialmente a revolta e, depois, o medo de que as seqüelas sabotem pouco a pouco a vida profissional, pessoal e familiar, afligindo principalmente aqueles com filhos para criar e os que ainda desejam tê-los.

A doença é progressiva e não tem cura. Os medicamentos surgidos nos últimos 15 anos têm conseguido diminuir a velocidade de seu avanço na maioria dos pacientes, com melhores resultados quando o diagnóstico é precoce, o que ainda é um desafio para os médicos. Novos remédios, que devem ser lançados em breve, prometem melhor eficácia – mesmo assim dificilmente dispensarão a reabilitação física e o acompanhamento psicológico, parte indispensável do tratamento.

Quase tudo nesta doença é imprevisível, a começar pelos sintomas, que se manifestam em surtos de intensidade e duração variáveis e podem incluir visão embaçada, fadiga, espasmos musculares, falta de equilíbrio, dormência em qualquer parte do corpo, urgência ou incontinência urinária, problemas de memória, dificuldades na fala, entre outros. Tais sintomas, porém, raramente aparecem juntos no mesmo paciente – a velha máxima “cada caso é um caso” nunca foi tão verdadeira como no da esclerose múltipla. Entre dois surtos, um período de remissão de duração também variável pode dar a impressão, nos que ainda não foram diagnosticados, de que o problema não é grave. “Como é passageiro, a maioria das pessoas não dá importância e não procura o médico. Alguns acham que é culpa do stress”, diz Maria Cristina Giácomo, coordenadora do departamento científico da Associação Brasileira de Esclerose Múltipla (Abem). Mais cedo ou mais tarde, no entanto, os sintomas voltam e com o passar do tempo sua recorrência vai deixando marcas irreversíveis.
O diagnóstico da esclerose múltipla em crianças e adolescentes tem sido cada vez mais comum. Estima-se que em até 5% dos portadores a doença se manifeste antes dos 16 anos, e em alguns casos raros ela já foi detectada antes dos 5 anos. Os sintomas podem ser um pouco diferentes da forma adulta, incluindo convulsões. Como a criança não consegue expressar muito bem o que está sentindo, o problema geralmente passa despercebido pelos pais. Mesmo entre médicos pode haver confusão, não sendo raro esses pacientes serem tratados como se tivessem meningite ou encefalite.

A evolução da esclerose múltipla infantil ou juvenil parece ser mais lenta, no entanto, se não for tratada, os pacientes podem acumular um grau significativo de incapacidade até a idade adulta, que geralmente compromete seu desempenho escolar e psicossocial. O tratamento é essencialmente o mesmo, embora os medicamentos sejam usados em doses mais baixas.

Como a doença atinge preferencialmente mulheres em idade fértil, a questão da gravidez deve ser vista com cuidado e se possível deve ser planejada junto com o neurologista, porque a gestação requer a suspensão dos medicamentos. Isso não chega a ser um sério problema porque os surtos são raros nessa fase devido às alterações hormonais no organismo da mulher, que exercem efeito protetor. O pior vem depois do parto, quando a probabilidade de novas crises aumenta em até 50%, e a reintrodução dos remédios para contê-las significa interrupção da amamentação.



Luciana Christante é farmacêutica e jornalista científica.

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